Feridas da Guerra

Amor,

Esta não é uma carta de amor. Não é que não seja ridícula, como qualquer carta de amor, não é que não seja sobre amor, como qualquer outra carta de amor. Não é uma carta de amor pelo simples facto que Tu, Amor, nunca a irás ler. É um simples desabafo quando a dor aperta mais, mas, tal como todos os outros desabafos, destinam-se a alimentar a fogueira em que aqueço as mãos gélidas.

Sei que este momento deve ser particularmente custoso suportar com a notícia da minha morte, mas é melhor assim; “o tempo cura”, apesar da dor, eventualmente, perseguir teus sonhos, as memorias serem sempre presentes e ficares indignada com a injustiça da vida e revoltada com Deus pelo menos serás capaz de refazer a vida.

Pelo menos um de nós terá a possibilidade de construir uma vida normal. A minha, por defeito, será perseguir-te no anonimato, olhar-te por entre as sombras, ao longe, ao longe... e, talvez, num dia mais ousado, em que a saudade do toque da pele seja insuportável, disfarçado, por entre a multidão a minha mão toque a tua.

Só podia ser assim, depois daquela bomba na guerra ter-me levado as pernas, a virilidade, a vida; ter-te levado a Ti.

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